24/08/2009

BeleZa AzUl

Ela estava feliz, linda no seu vestido azul com a "e'charpe" pelos ombros... e apaixonada... usava inclusivamente aliança de compromisso (oferecida por ele num aniversário seu). Nunca achou que aquilo significasse alguma coisa... Ter ou não ter aliança não iria reforçar o sentimento que tinha por ele... Mas achou o gesto bonito. Pensou mesmo, que com aquilo tudo ele gostava mesmo dela... Portanto, ía ser simplesmente um dia perfeito! Estava lá toda a gente... Acabara de se licenciar e uma festa foi organizada para comemorar o fim de 4 anos agarrada a livros e noites mal dormidas! Por ela, o ideal era convidar "aqueles" amigos mais chegados e passarem a noite toda a comer pizza e a beber cerveja!
Mas o orgulho paternal era tanto que foi exigido muito mais que isso. Aquilo parecia mais um casamento do que propriamente uma comemoração! Um conjunto musical tocava tudo e mais alguma coisa e havia empregados por todo o lado! Havia pessoas que mal conhecia e poderia até dizer que nunca tinha visto...
Passou a noite anterior no recato do seu lar, com as suas amigas e família, a divertir-se e a cuidar dos últimos preparativos para a festa, quando o seu telemovel tocou, sms dele... que dizia simplesmente “Amo-te”.
Sorriu... era impossivel não fazê-lo... Tinha 21 anos e naquela idade tudo parecia perfeito. Namorava com o suposto "homem" da sua "vida" e dali a poucos meses completavam 5 anos de namoro.
Mas no dia da festa ele estava diferente... mais distante... aborrecido e chegava a ser arrogante!
Era estranho mas todos nós temos dias assim... diferentes...
Ou simplesmente estava um pouco enciumado com toda a atenção que ela estava a receber.
Até ao momento do "copo d’água"! Ele não entrou com ela.
Ficaram os 2 sozinhos cá fora... e ele disse que não se sentia bem... que tinha mesmo que partir... sair dali... e a pequenos passos começou a afastar-se dela.
E ela entrou em pânico... não estava a perceber... que se passava? Tinha ela feito algo de mal? Aliás, no fundo ela sabia que não tinha feito nada de incorrecto... mas naquele tipo de momentos questionamo-nos sempre... pensamos em tudo e voltamos a analisar em segundos na nossa mente se fizemos ou não algo que possa ter contribuído para o mal estar daquela pessoa num determinado momento.
Ele caminhava em direcção ao carro e ela preocupada, corria atrás dele, para saber o que se passava. Queria uma explicação... implorava mesmo por isso. Não percebia porque raio estava ele a deixá-la sozinha no meio daquela confusão toda!
- “Existe outra pessoa?"
Perguntou na sua mais pura inocência ao esperar uma resposta negativa da parte dele.... que acabou por não ser negativa... Ele afinal tinha um outro alguém e esteve com esse alguém na noite passada... logo a seguir aquela mensagem que ela recebeu e sorriu...
Naquele segundo caiu-lhe tudo... a verdade estava a vir ao de cima e ela não queria aceitá-la. Não podia ser... Por segundos pensou que era tudo mentira, que tudo ía voltar ao normal. Mas enganou-se.
Ele entrou no carro e foi-se embora... deixou-a no meio do parque de estacionamento... sozinha. As lágrimas finalmente começaram a cair aos poucos até se tornarem cada vez mais intensas.
Olhou para a aliança... tirou-a, ficou a olhar para ela durante alguns minutos.
Ouviu a voz do pai. Estava a chamá-la. Esperavam-na lá dentro como seria normal... e reparou que ela estava sozinha... e a chorar!
Olhou para ele... “Desculpa... vou já para dentro e não te preocupes, eu estou bem”.
Ele não disse uma palavra... Mas é pai... Olhou para ela, beijou-lhe a mão e abriu-lhe a porta. Foi para dentro, tentou compôr-se na casa de banho e o resto do dia... foi puro fingimento.

Tentava lutar por uma postura correcta e tranquila.

As pessoas perguntavam por ele (o que a punha ainda mais desconfortável) e como desculpa, justificava a sua ausência por problemas familiares. Mas no fundo ninguém acreditava nas suas palavras. Por uma simples razão: a aliança já não estava no seu dedo.
Foi um dia angustiante... Mas foi uma perfeita actriz!
Passou o dia inteiro a beber e quando reparou que só dizia merda, decidiu fazer um favor a ela mesma e acabar a noite sentada num banco de jardim com a garrafa ao lado. Já não tinha maquilhagem, o cabelo estava um nojo, o vestido azul amarrotado e estava descalça... doíam-lhe imenso as pernas! Passou o dia inteiro a beber e a dançar. Sentia-se assim... a pior pessoa do mundo. A sensação de sermos abandonados por alguém deixa-nos tão pequenos que até uma mosca se torna bem mais poderosa que nós, naquele momento. E nada a podia acalmar, nada nem ninguém. E muito menos o tal tempo que todos dizem ser o melhor aliado nestas alturas. Qualquer tipo de conversa com o objectivo de a animar era inútil. Agradecia o carinho que as pessoas lhe transmitiam, claro, mas nada... mesmo NADA, a animava. Nada a fazia sentir-se melhor. A dor é tão forte e amarga que não nos deixa raciocinar com clareza. Invade o nosso espirito e entranha-se lá... por completo, toma conta do nosso psicológico e manipula os nossos actos.

Sim... ok... acaba por ser psicológico. E depois? Ela não era das que conseguia dividir as coisas. Não conseguia bloquear aquele momento numa parte da sua mente.
Puseram-lhe os cornos! Não conseguia simplesmente pôr isso de parte e sorrir.
A única coisa que queremos é apagar aquele momento, fazer desaparecer a dor... algo que nos deixa de tal maneira angustiados que nem o nosso próprio choro serve como desabafo. Só queríamos estalar os dedos e acordar como novos... mas não... não funciona assim... é sem duvida uma das piores dores que se pode sentir. E desesperadamente só temos que aguentá-la. Dia após dia... uns dias melhor, outros nem tanto... mas vivendo... um dia de cada vez... com calma... e aos poucos ganhar esperança, (aquela esperança que julgávamos perdida), de que realmente possamos voltar a sorrir e a pensar de outra maneira. Ver o nosso dia-a-dia de outra maneira.
Mas enquanto estamos naquele momento sem uma única visão positiva, inventamos todo o tipo de situações para poder ao menos enganar a dor... mas não resulta, porque ela continua a estar lá. Nem adormece sequer.
Ao continuar naquele banco de jardim, tão concentrada nos seus problemas, nem sentiu que aos poucos alguém se aproximava.

- “Com licença... a menina deixou cair isto esta tarde... penso que lhe pertence “
A sua "e'charpe"...
Era um dos empregados da festa...
Enxugou mais uma vez as lagrimas, sorriu e agradeceu.
- “A menina sente-se bem?” perguntou ele. Aquele tipo de perguntas estúpidas que as pessoas fazem, e que mesmo já sabendo a resposta, perguntam na mesma para parecer bem.
Era alto, tinha um olhar brilhante e transmitia serenidade...
Sorriu novamente e acenou de uma forma positiva. Até lhe ofereceu um gole de champanhe da sua garrafa.
Passado 2 horas estava na cama com ele.
Nunca mais o viu... Nem se lembrava do nome dele...
Quando acordou, sentiu uma enorme dor de cabeça e quando olhou para o lado, aquele desconhecido estava ali... sentiu vómitos e sem pensar pegou nas coisas dela e fugiu.
Ele acordou... sozinho... procurou por ela mas num determinado momento percebeu a história toda quando viu na mesa de cabeceira um anel... supostamente de compromisso... com um nome feminino ( o dela ) e uma data.
- " Bem... esta tem mesmo a mania de perder tudo pelo caminho..."

Tudo aquilo era tão ridiculo...
Desgostos de amor?
Tanto drama por causa disso... quando na verdade, não é o pior problema da vida... pois não?
Depois de um bom banho e um pequeno almoço bem reforçado... olhou-se ao espelho. Penteava-se e preparava-se para sair. Sorriu... irónicamente, mas sorriu. Principalmente quando tropeçou em quaquer coisa: o vestido azul. E sem saber porquê... sentiu-se bem. Aquela cor de uma certa forma reconfortava-a... e deu por ela a pensar. Recordou a vida que tem, para tudo o que a rodeava e pensou nas muitas pessoas que adoravam viver a vida dela. Tinha um lar onde se refugiar... uma família perfeita que a apoiava em tudo, os melhores amigos do mundo... Que mais podia ela querer? Ele? Para quê? Agora nem isso valeria a pena...
Era injusto. E sintia vergonha por ser tão egoísta a esse ponto. Ele que ficasse com ela. Mas aquele tipo de dor... é muito mais forte e transformava-se outra vez num drama sempre que pensava nisso. É irracional. E só quem passou por lá, é que pode dar o devido valor. Porque quando amamos, entregamos tudo. Até aqui nada de novo.
O problema... é habituarmo-nos ao vazio que a outra pessoa deixa quando se vai embora.